No dia 20 de dezembro, em reunião com representantes da Federação Nacional dos Portuários (FNP), o ministro da Secretaria de Portos (SEP), Antônio Henrique Silveira, confidenciou que a SEP vem recebendo pressão para abrir espaço para a terceirização da Guarda Portuária.
A Regulamentação da Guarda Portuária foi um dos temas da reunião. Mais uma vez os portuários afirmaram ao ministro que são contra a terceirização da atividade. Silveira disse que se reunirá com os trabalhadores em janeiro para tratar do assunto e que a Portaria de normatização da Guarda Portuária só será publicada após esse debate.
Participaram da reunião com o ministro, o presidente da FNP, Eduardo Guterra, o diretor de administração e finanças da FNP, José Renato Inácio de Rosa, os advogados Rodrigo Torelly e Raquel Perrota, do escritório Alino & Roberto e Advogados, que prestam assessoria jurídica à FNP, a chefe de gabinete da SEP, Rita Munk, e os assessores da Secretaria, Leonardo Lanna, Martinho dos Santos e Marcelo Ryudi.
Intenção é terceirizar uma parte
Em reunião realizada no dia 19 de novembro, os técnicos da SEP já deixaram claro que a intenção é permitir a terceirização de algumas atividades da Guarda Portuária, mediante uma análise de risco a ser efetuada nos portos.
Na explanação inicial, os técnicos informaram que a primeira etapa foi fazer um levantamento de dados, consultar as regulamentações, tanto de outros setores como dos próprios portos e os regulamentos internos para ver o que era comum. Foi analisada uma proposta apresentada pela Federação, realizada duas reuniões com chefes de segurança dos portos de Santos, Espírito Santo, Rio Grande e Ceará, para auxiliar, na questão da Guarda, escolhidos por terem perfis diferentes, alguns com todos os guardas do quadro outros com quadros mistos, e uma consulta prévia a assessoria da Advocacia Geral da União (AGU), mas deixaram claro que todos os pontos seriam discutíveis.
Os técnicos da SEP efetuaram um levantamento de dados, com o envio de formulários aos portos, 30 portos responderam. Destes 30 portos, o efetivo foi de 2280 guardas, sendo 67%, 2/3 terços de pessoal do próprio porto e segurança privada 781, 47% dos portos tem só pessoal próprio, sem segurança privada, 40% tem segurança privada e 13% um quadro misto.
A partir deste estudo inicial, a equipe da SEP constatou uma diversidade muito grande, alguns portos são Companhias Docas outros são delegados. Os quantitativos do quadro da Guarda não tem vinculação com critérios objetivos, como o tamanho do porto, com o tipo de função e observaram que as características operacionais do porto geram necessidades diferentes.
“Não queremos tirar da administração dos portos o que já vem se fazendo, pois em todo o porto existe uma necessidade que todo o porto vai conhecer e resolver, nós queremos fortalecer e qualificar a segurança nos portos”, disse Xavier.
Padronização Mínima das Estruturas
A intenção da SEP é dar uma padronização mínima das estruturas da Guarda Portuária nos portos, se baseando em alguns pontos:
1º Estruturação de uma Unidade de Segurança Portuária subordinada diretamente ao dirigente máximo da Administração Portuária em todos os portos organizados.
2º Estabelecer as Unidades de Segurança em dois níveis de atividades dentro do porto, de gestão e de planejamento e as atividades de segurança em si, atividades de controle, de entrada e saída, de ronda, de vigilância, isto é, atividades mais de segurança.
Para as atividades de gestão e segurança seria utilizado prioritariamente pessoal do quadro próprio. Tem portos que tem toda a sua Guarda do quadro de pessoal, então ele já tem o material humano para colocar nestas funções mais estratégicas de organização do sistema de segurança, tem outros portos que já não tem, então vão precisar contratar.
3º Estabelecer um processo de capacitação. A SEP está trabalhando num processo de capacitação permanente para estas atividades da Guarda e já existe uma previsão dentro do sistema de segurança nos portos de uma capacitação, então fortalecendo esta Unidade de Segurança trabalhariam neste sistema de gestão fazendo um plano para capacitação permanente.
4º Distribuição de pessoal próprio e de serviços privados, a proposta é que seja feito com base em critérios técnicos, que seja utilizada a avaliação de risco para fazer o dimensionamento e distribuição do efetivo. Utilizar a análise de risco para definir o quantitativo entre o pessoal próprio e o privado.
5º Padronização da instalação da guarda de armas, uniforme, isto é, colocar um padrão que tenha a identificação do porto, do profissional.
6º Critérios para o regimento internos, como a publicação nos sites, do Regulamento da Guarda.
Segundo a equipe da SEP, estes são os pontos que entendem ser de discussão. Questões como terceirização de pessoal, se é atividade fim ou atividade meio, como estas questões estão sendo debatidas no Congresso Nacional, talvez não se tenha alcance dentro de uma Portaria para alcançar estes assuntos. A Regulamentação por Portaria tem alguns limites. Tem que abranger os 35 portos do país.
Área de Atuação
Segundo Xavier, ao analisar o regulamento de todos os portos a equipe de trabalho percebeu que em alguns portos a Guarda atua em área marítima, só que existem problemas de jurisdição, que a área marítima e da Polícia Marítima, Polícia Federal e a própria Marinha, então chegaram a conclusão que na Regulamentação, a área de atuação é na área terrestre.
Debates
Eduardo Xavier abriu os pontos para debates aos representantes da Guarda Portuária que estavam presentes, dizendo que não existem formulações, só ideias.
Sérgio Gianetto (Sindicato dos Portuários-RJ) foi o primeiro a defender a não terceirização da Guarda Portuária: “Quando se faz uma
Lei existe a intenção do legislador. Quando o Senador Eduardo Braga falou da Guarda Portuária foi colocado claramente não ter terceirização, isto ficou claro no documento e foi um compromisso formal não só do Senador como daqueles que fizeram a medida provisória como também do Governo Federal. Nós não podemos admitir se quer pensar em terceirização, não se pode nem cogitar, isto é uma coisa que não vamos aceitar porque foi compromisso do Governo”.
O Senador Eduardo Braga no seu relatório final colocou: “Relativamente a melhora das referidas condições de trabalho houve a positivação no Art. 17 de que compete a Administração do Porto organizar a Guarda Portuária, providência que evita a terceirização de atividade fim inerente a segurança dos portos nacionais”.
Gianetto criticou também o entendimento sobre a área de atuação da Guarda Portuária: “Tem que ser na área do Porto Organizado. A área do Porto Organizado vai da Bacia de Evolução, passa pelo Canal de Acesso e atinge todas as dependências do porto. Se na área marítima existem várias outras autoridades, na área terrestre também existem, cada um dentro de sua atividade específica. O mesmo papel que a Guarda Portuária tem área terrestre ela tem na área marítima”.
Jorcy de Oliveira (SINDGUAPOR-ES) alertou a equipe da SEP que em 2006 houve uma consulta da Companhia Docas do Ceará (CDC) à Advocacia Geral da União (AGU), que resultou no Parecer 290/2006 que definiu como atividade-fim a atividade da Guarda Portuária, e deixava claro que era impossível a terceirização, que o ingresso só se daria por concurso público. Em função disto no Espírito Santo, houve um concurso em 2005, no entanto, a posse só ocorreu em 2008, após uma posição firme de órgãos de controle externo, como Tribunal de Contas da União (TCU) e Ministério Público Federal (MPF).
Ele também alegou que a terceirização possibilita relações promíscuas, portanto não podemos aceitar o guarda terceirizado competindo na área do guarda portuário, pois isto é prejudicial a segurança portuária.
Citou ainda que a Portaria 121-SEP menciona que as áreas do ancoradouro, docas, cais, pontes e píeres de atracação e acostagem, terrenos, armazéns, edificações e vias de circulação interna, pertencentes ao Porto Organizado.
Djalma (Sindicato dos Portuários-RJ) abordou que, no escopo da Regulamentação não se viu a definição do relacionamento entre a Guarda Portuária e as vigilâncias dos terminais arrendados, que está contemplada na Portaria 121-SEP. “Deve ter alguma coisa dentro da Portaria que regule essa subordinação dentro do Plano de Segurança dos Portos”.
Sergio Mendonça (Sindicato dos Portuários-RJ) atentou para a oportunidade de melhorar a imagem da nação no aspecto da segurança. “Em todos os portos o controle de acesso é fundamental. Em alguns portos administrado pelas Companhias Docas já tem esse controle de acesso. A nossa expectativa é ter o mesmo modus operandi no Rio, em Santos, no Espírito Santo, em Fortaleza, e hoje de certa forma isto não acontece”.
Alegou ainda que o policiamento marítimo é de responsabilidade da Autoridade Portuária, que deve ter em todos os portos uma equipe mínima, inclusive para fiscalizar a parte de meio ambiente.
Ulisses Junior (SUPORT-BA) citou um caso ocorrido na Codeba “Recentemente houve lá um problema, algumas pessoas adentraram ao porto e a Polícia Federal pediu as imagens e o coordenador do Porto não tinha a senha e aí teve que ligar para Salvador para uma pessoa comissionada, não do quadro da empresa, ceder essa senha para poder abrir as imagens. Essa pessoa não atentando para a necessidade premente da coisa queria ir lá depois de dois dias”.
Citou ainda: “A segurança do porto está muito relegada, você entregar senhas de segurança de um porto brasileiro a um privado que sai dali com aquilo na mão é complicado, por isso, nossa grita contra a terceirização da segurança dos portos brasileiros. Nas demais autoridades todos são funcionários de carreira, Policia Federal, Receita Federal, Marinha, todo mundo é funcionário de carreira, ou seja, assumem a sua responsabilidade, se algo acontecer de errado, vão responder por aquilo. A Guarda Portuária que deveria trabalhar conexa a tudo isto, em alguns lugares é terceirizada e aí a coisa não funciona a contento”.
Outro ponto colocado por Ulisses é a necessidade de um treinamento adequado e a motivação para que este trabalho seja bem feito e aí a SEP tem o poder de influir nesta situação.
Ange Biniou (Sindicato dos Portuários-RJ) – Falou do anseio da categoria de ter alguma coisa dentro da SEP, que seja uma secretaria, uma consultoria, que trate especificamente de assuntos relacionados com a Guarda Portuária para poder unificar e padronizar, inclusive para depois de implementada a nova regulamentação, ter um feedback, inclusive para numa segunda etapa discutir os Regimentos Internos, pois haverá a necessidade que a SEP se envolva nisso.
Carlos Rocha (Sindiporto-Pará) citou a experiência do Porto do Pará, onde uma grande parte da Guarda Portuária é terceirizada: “ O que mais nos preocupa é que estão pegando o nosso setor de monitoramento, onde quem está trabalhando não é um guarda é um vigilante terceirizado, que muda constantemente, portanto as informações que deveriam estar contidas na empresa, quando as pessoas saem, elas levam informações importantes, este é um dos motivos de sermos contra a terceirização da Guarda Portuária”.
Luis Borba (Sind Port. Candeias-BA) relatou um fato ocorrido no Porto de Aratu. “Houve um tempo em que nós tínhamos guardas terceirizados e tinha roubo de carga direto e tinham terceirizados que estavam envolvidos no roubo de carga, eles deixavam sair carretas de fertilizantes. Depois que foi retirada esta guarda terceirizada de lá, diminuiu esta questão do roubo de carga”.
José Carlos (SINDIGUAPOR-BA) bateu na terceirização: “Um guarda terceirizado nunca vai ter um vínculo, nunca vai ter um comprometimento como o guarda de carreira. Se o vigilante descumpre alguma regra ele é trocado imediatamente e vem outro, não tem aquele conhecimento do guarda portuário, não tem um curso adequado, ele assume a função de paraquedas e aí o que acontece, ele leva as informações para fora, referente à segurança e o controle de acesso ao porto. Temos que aumentar o quantitativo e qualitativo de guardas portuários através de concurso. Precisamos ter alguém da Guarda aqui na SEP”.
Felipe Cordeiro (Sind, Trab. Portuários do Paraná) falou que a Guarda é específica e é um dever do Estado: “Ela não se compadece com uma alta-rotatividade que é típica de uma empresa terceirizada. Estamos falando de uma gestão de informação bem como o compartilhamento desta informação com os poderes estaduais e federais, como a Polícia Federal, a Receita Federal e a Capitania dos Portos, então temos dentro da Autoridade Portuária um elemento muito forte que é a Guarda Portuária que tem um dever de Estado”.
Citou ainda: “Tem gestores aguardando a definição do momento para encaminhar o processo de terceirização da Guarda Portuária, que é o nosso caso no Paraná. Estão esperando o encaminhamento para terceirizar todos os postos da Guarda Portuária. Este processo está parado em função de aguardar a definição que vocês vão dar, então há um risco que a Guarda Portuária corre ao não definir a proibição da terceirização”.
Francisco Gomes da Silva (SINDEPOR-Ceará) também defendeu a não terceirização “Eu sou supervisor de turno, lá eu trabalho com 05 guardas portuários e 11 vigilantes terceirizados, todo dia um vigilante novo se apresenta. Quem é você? Eu vim substituir o João. O cidadão não sabe nem onde era o Porto, mas a empresa terceirizada pega um cara que trabalhou num armazém, numa farmácia e joga lá no Porto. O que nós queremos reportar é sobre a não terceirização. O nosso Porto hoje tem mais de 50% terceirizado, a nossa sorte é que nós guardas portuários é que ainda fazemos o controle de acesso, seja de carga ou de pessoas. O Portão Principal está sob o comando da Guarda Portuária, mas mesmo no portão principal nós temos dois terceirizados que nos auxiliam nos computadores que dão acesso a entrada dos usuários. É certo que todo o sistema de câmeras do Porto vai ser terceirizado. É o terceirizado que vai ver todas as imagens e vai ver tudo o que está acontecendo no porto e o guarda portuário não vai ter acesso diretamente. Então é não a terceirização, isso é o que nós queremos aqui”.
Hernane (Suporte-CODESA) falou que é preciso ter uma visão de nação, que presta serviço à sociedade com responsabilidade. No Espírito Santo não vi chegar o ISPS-Code, o Plano Internacional de Segurança nos Portos, não sei onde funciona. Quando a Codesa precisa verificar alguma coisa no terminal portuário ela não entra, então o papel da Autoridade Portuária não existe, é ultrajante ver o trabalhador pedir: regulamenta o meu trabalho, não coloca terceiros. “A gente precisa ter uma Guarda Portuária séria. Precisa ter uma Guarda Portuária que funcione, porque o trabalhador no nosso caso lá, tá omisso, porque os bandidos estão entrando no porto e roubando cabos e equipamentos, estão roubando tudo. Não cabe terceirização na atividade de segurança pública, e o porto presta serviço de segurança pública”.
Após ouvir as opiniões dos representantes da Guarda Portuária, Eduardo Xavier declarou que é necessário valorizar e dar maior capacidade de segurança planejamento e gestão à corporação: “Dentro do nosso diagnóstico a gente tem uma estrutura e necessariamente dentro desta estrutura seria reservado parte dela para o planejamento e gestão, por isso a análise de risco não seria necessariamente para terceirizar, ela seria para entender como o porto se comporta no tempo, quais são os riscos, as oportunidades, ameaças e estratégias para esse crescimento numa análise em todos os portos. Essa análise seria para complementar a capacidade de gestão, para saber como o porto se comporta e quais são as características mais importantes daquele porto específico e então dentro desta capacidade de planejar você poderá melhor treinar e capacitar às pessoas para a sua necessidade específica. Essa estrutura a gente entendeu em colocar próximo, em interface direta com o presidente da instituição, não para contaminar com indicações políticas e também não para colocar como determinantes para a terceirização, pensamos só em melhorar a execução da atividade, determinando a necessidade de um órgão de gestão e planejamento.
Para o ministro Silveira, a Regulamentação não vai refletir a experiência de cada Companhia Docas e dos portos delegados no seu aspecto de gestão. As companhias tem que ter o espaço para a adaptação da gestão para adequar as suas realidades. O espírito é determinar quais são os aspectos essenciais para a Regulamentação da Guarda Portuária. “Nos portos delegados o estado tem a preponderância e nas Companhias Docas da União temos uma diversidade muito grande entre São Paulo e Rio e o Rio Grande do Norte e temos que dar espaço para elas se adaptarem ao seu aspecto de gestão. Temos que procurar uma diretriz geral e não normas completas. Estamos dispostos a discutir ponto a ponto”.
Por Carlos Carvalhal, Inspetor da Guarda Portuária (Porto de Santos), Articulista da Revista Segurança e Cia., Membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.